Dataísmo #31 - Especial Nordeste Washing, o greenwashing do Nordeste
🌵 Em meio aos papos de usar símbolos nordestinos, trago aqui o que já postei no blog: minha proposta de chamar Nordeste Washing, o greenwashing do Nordeste. A "Invenção do Nordeste" é real.
O termo "Nordeste Washing"... (pera ainda*, o que é isso?). É uma expressão que estou propondo agora. Tem zero buscas no Google sobre isso. Mas trazer um termo "pop" e em "inglês" tem um objetivo. Quero resumir e descrever uma prática que se assemelha ao greenwashing, mas em relação à região nordeste do Brasil.
*pera ainda e não pera aí é uma expressão que significa "segura"ou peraí.
Atualmente, vemos algumas ações na mídia para a região ou sobre o Nordeste. Elas têm crescido. Em minhas duas pesquisas acadêmicas sobre Nordeste/cordel, e também vivendo e pesquisando o mercado de comunicação hoje, pude entender melhor isso e como se desenrola.
Assim como o greenwashing envolve ações que aparentam ser ambientalmente responsáveis, mas na realidade não o são, o Nordeste Washing refere-se a iniciativas que parecem estar comprometidas com a causa nordestina, mas que, na prática, não contribuem de forma significativa para a região ou para a inclusão dos nordestinos.
Um exemplo desse fenômeno pode ser observado quando algumas empresas ou marcas fazem campanhas publicitárias que destacam o Nordeste e suas culturas uma vez por ano, geralmente durante festas populares como o São João ou o Carnaval.
Essas campanhas podem incluir elementos típicos da região, como músicas, danças, trajes e até mesmo o sotaque característico.
No entanto, durante o restante do ano, essas empresas raramente têm envolvimento real com a região, sem investimentos, ações sociais ou parcerias de longo prazo com instituições locais.
A consequência dessa prática para a imagem das marcas e empresas de comunicação pode ser negativa.
Embora as campanhas sazonais de Nordeste Washing possam atrair a atenção momentânea do público e gerar algum buzz nas redes sociais, muitas vezes elas são percebidas como oportunismo e falta de comprometimento genuíno com a região.
Crítica e foco em novas gerações
A audiência está cada vez mais consciente e crítica em relação a ações de marketing vazias, e essa falta de autenticidade pode levar a uma perda de confiança e credibilidade por parte do público.
É por isso que hoje em dia se discute o storydoing e não apenas o storytelling.
Em outras palavras, as pessoas e, em especial, as novas gerações, buscam conexão com marcas e empresas que praticam o que falam. E não só aquelas marcas que contam histórias.
A maioria da geração Z, por exemplo, apoia movimentos sociais como Black Lives Matter, direitos transgêneros e feminismo.
Parte da mentalidade ligada à diversidade está em sua origem e também é somada com a convivência com pessoas diferentes (dados do Insider Intelligence 2022).
“A inclusão é cada vez mais esperada, especialmente pela geração Z e pelo público da geração millennial”(Jill Estorino, presidente e diretora administrativa da Disney Parks International na The Walt Disney Co).
Pensando nisso, a prática do Nordeste Washing também pode afetar negativamente as relações entre empresas e a população nordestina.
E vale recordar que o Nordeste é grande diverso. Ele concentra, aproximadamente 30% da população do país em cerca de 20% da extensão territorial brasileira.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2018), a Região tem cerca de 56,7 milhões de habitantes, distribuídos ao longo de 1,6 milhão de km2.
Em 2023, é a maior projeção de crescimento do PIB Nacional.
É da região que vem alto nível de educação, também. Apesar da desigualdade dos 9 estados do Nordeste entre si, é dos nordestinos que se têm alguns dos maiores índices de educação brasileiros (e, por consequência, senso crítico).
Concentra estados recordistas nas Olimpíadas de História Nacionais;
Criou-se até um ITA no Nordeste, pois os nordestinos migravam (e passavam) no ITA de outras regiões com notas maiores que os habitantes de São Paulo. Para se ter uma noção, das 150 vagas do ITA, 70 eram de nordestinos.
Para as marcas e empresas de comunicação, é importante entender que ações vazias e oportunísticas podem ter um impacto negativo em sua reputação e resultados financeiros a longo prazo.
Em um mundo cada vez mais conectado e consciente, a autenticidade e o comprometimento genuíno com as causas e as regiões são fundamentais para construir uma imagem positiva e sustentável no mercado.
É essencial que as empresas evitem práticas de Nordeste Washing e busquem formas reais de contribuir para o desenvolvimento e a inclusão da região nordeste e de pessoas nordestinas.
O Nordeste não é só São João, praia e cuscuz. O nordeste é isso também, mas vai além.
A comunicação e o marketing devem ser baseados na sinceridade e na construção de relações de confiança a longo prazo com os consumidores, e o Nordeste Washing vai na contramão desse princípio.
E há senso crítico, estudos e ocupação nas melhores universidades do Brasil.
Um grupo de pessoas qualificadas, educadas e nordestinas está de olho. O Nordeste existe. Então as marcas deveriam estar, também, com ele nas suas estratégias. Mas do jeito mais autêntico possível.
Extra: quem sou eu na fila do cuscuz?
Além de atuar e pesquisar o mercado de comunicação e dados (graduação em marketing, pós em Digital Business), eu também já publiquei pesquisas de cultura brasileira. Meus trabalhos acadêmicos foram: "O sistema do cordel: a literatura da comunicação" e "O cordel como sistema cultural de comunicação".
Obrigada por ter chegado até aqui!
Essa é uma edição extra (e especial) do Dataísmo news.
Sobre o Dataísmo
👩💻 Escrito por Juliana Freitas, potiguar no Rio de Janeiro. Profissional de Comunicação, Consumer Insights e pesquisadora.
📊💡 O Dataísmo foi criado para compartilhar (enquanto busco aprender e melhorar) sobre comunicação, cultura e consumo, com histórias guiadas por dados.
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